30/05/2024 s 09:31 5ke6i
Agncia Brasil
O Poder Executivo deixou de aplicar 35,5% dos recursos destinados ao programa de Gesto de Riscos e Desastres da Defesa Civil entre 2012 e 2023. Dos R$ 33,75 bilhes previstos no Oramento para aes de resposta, recuperao e preveno, R$ 21,79 bilhes foram efetivamente pagos pela Unio ou transferidos a estados e municpios — o equivalente a 64,5% do total. Os dados so do “Recursos para gesto de riscos e desastres”, mantido pelo Tribunal de Contas da Unio (TCU).
As medidas de resposta e recuperao representam a maior parte dos recursos desembolsados. O TCU classifica como resposta o socorro s vtimas e o restabelecimento de servios essenciais, como fornecimento de gua, cestas bsicas, itens de higiene e limpeza urbana. A recuperao envolve a reconstruo de infraestruturas danificadas, como pontes, bueiros e pequenas contenes. Dos R$ 21,79 bilhes pagos no perodo, R$ 15,12 bilhes (69,4%) foram para essas aes.
Uma fatia bem menor dos recursos foi para medidas de preveno — obras de infraestrutura executadas para evitar ou reduzir a ocorrncia de novos desastres. Apenas R$ 6 bilhes (27,6% do total) foram efetivamente pagos. Um valor residual de R$ 674,36 milhes (3%) foi aplicado em outras aes no especificadas pelo TCU.
Levando apenas em conta os recursos aplicados no programa de Gesto de Riscos e Desastres da Defesa Civil, o Poder Executivo gastou mais dinheiro para recuperar os estragos causados por fenmenos naturais do que para preveni-los. Para cada R$ 1 destinado a resposta e recuperao nos ltimos 12 anos, a Unio aplicou apenas R$ 0,39 em preveno.
‘Desperdcio’
PhD na rea de Gerenciamento de Riscos e Segurana, o engenheiro e pesquisador Gerardo Portela considera “um desperdcio” o Brasil ter deixado de aplicar 35% dos recursos reservados ao programa de Gesto de Riscos e Desastres.
"Isso mostra que no h um entendimento das autoridades sobre o grau de severidade desses fenmenos. Ou seja, o quo eles podem ser letais para as vidas humanas, assim como para o meio ambiente como um todo. A percepo de risco no Brasil no algo muito desenvolvido culturalmente. Nossa cultura de segurana ainda muito primitiva. Por no percebermos a gravidade da situao, muitas vezes deixamos de investir aquilo que j no muito e deixamos de avanar nas salvaguardas para esse tipo de fenmeno".
Os equvocos e omisses na conduo da poltica para o clima, entretanto, no se limitam questo dos valores parados no cofre. Segundo o engenheiro, a Defesa Civil no tem a funo de preparar o pas para prevenir desastres naturais. Na opinio de Portela, o Brasil deveria contar com um ministrio especfico para desenvolver obras de infraestrutura capazes de fazer frente aos riscos ambientais, munido de um plano nacional “que tenha comeo, mas no tenha fim”.
"A Defesa Civil um rgo que atua na resposta emergncia. Ela no projeta nada, no elabora nada para a infraestrutura do pas a longo prazo. A gente deveria gastar mais na preveno, que no um assunto da Defesa Civil. A questo da infraestrutura deve ser capitaneada pelo governo federal. Precisamos gastar com Defesa Civil porque as emergncias esto acontecendo a toda hora, no fizemos o dever de casa. Mas preciso dimensionar nossa infraestrutura, que foi projetada para os anos 1940", argumenta o engenheiro.
Cenrio de terror
O ano de 2021 foi descrito pelo antigo Ministrio da Infraestrutura como “extremamente atpico no que se refere aos ndices de precipitao pluviomtrica”. Pelo menos 13 estados brasileiros declararam situao de emergncia ou calamidade pblica.
Chuvas intensas causaram estragos no Amazonas, no Par e em So Paulo. Um ciclone extratropical deixou 80 mil pessoas desabrigadas por alagamentos e deslizamentos de terra na Bahia. Em Minas Gerais, o nmero de atingidos superou a marca de 40 mil. Os temporais interromperam o fornecimento de energia e gua potvel, interditaram estradas e destruram pontes e viadutos.
Apesar do cenrio de terror, aquele foi o ano em que o Poder Executivo menos gastou com Gesto de Riscos e Desastres. De R$ 1,22 bilho previsto no Oramento, o presidente Jair Bolsonaro autorizou o pagamento de R$ 914,19 milhes. Desse bolo, apenas R$ 173,91 milhes (19%) foram para preveno. As aes de resposta, recuperao e outras consumiram R$ 740,28 milhes (81%).
Nos quatro anos de mandato de Jair Bolsonaro, registraram-se os menores aportes ao programa. Entre 2019 e 2022, o Poder Executivo pagou diretamente ou transferiu a estados e municpios um total de R$ 4,37 bilhes. Isso equivale a uma mdia anual de R$ 1,09 bilho.
"Os maiores rees foram feitos durante a gesto de Dilma Rousseff. De 2012 (quando comea a srie analisada pelo TCU) at 2015 (ltimo ano completo de governo antes do impeachment), a ento presidente da Repblica aplicou mais de R$ 9 bilhes", uma mdia de R$ 2,25 bilhes anuais.
O exerccio em que houve o maior volume de pagamentos foi 2013, quando os desembolsos superaram os R$ 3 bilhes. Naquele ano, a estiagem no Nordeste provocou perdas de at 90% na safra dos pequenos agricultores, e o Rio de Janeiro enfrentou uma srie de alagamentos.
Nos dois anos completos de governo de Michel Temer (2017 e 2018), a mdia de gastos com Gesto de Riscos e Desastres foi de R$ 1,75 bilho. No primeiro ano do atual mandato (2023), o presidente Luiz Incio Lula da Silva autorizou despesas de R$ 1,39 bilho.
No total de 13 anos (2012-2024), foram previstos R$ 38,44 bilhes e pagos R$ 22,29 bilhes, incluindo R$ 1,52 bilho de restos a pagar — despesas empenhadas mas no pagas at o dia 31 de dezembro de cada ano — distribudos por todo o perodo. Os valores pagos em 2024 alcanam apenas os meses completos de janeiro a abril e o ms de maio at o dia 24.
Estados
O do TCU detalha os empenhos do Poder Executivo para o programa de Gesto de Riscos e Desastres. O empenho a primeira fase da execuo da despesa pblica, quando a Unio reserva o dinheiro que ser pago quando um bem for entregue ou quando um servio for concludo. Entre 2012 e maio de 2024, foram empenhados R$ 26,92 bilhes.
A Unio aplicou diretamente R$ 12,56 bilhes, mas a maior parte do dinheiro foi transferida para estados e municpios: R$ 14,36 bilhes. So Paulo foi o estado que mais recebeu recursos da Unio (R$ 2,36 bilhes). Na sequncia, vm Rio de Janeiro (R$ 1,77 bilhes), Minas Gerais (R$ 1,2 bilhes) e Bahia (R$ 1,13 bilhes).
O Rio Grande do Sul, assolado por alagamentos que mataram mais de 160 pessoas neste ano, figura na quinta posio (R$ 1,13 bilho). Mas possvel perceber que, desde 2020, h uma curva ascendente no volume de recursos dirigidos ao estado. Os empenhos realizados nos ltimos quatro anos respondem por quase 70% de todos o dinheiro reservado para os gachos desde 2012. Os nmeros refletem a escalada na ocorrncia de desastres climticos na regio.
A Lei Oramentria deste ano reserva R$ 4,69 bilhes para o programa Gesto de Riscos e Desastres da Defesa Civil — o maior valor desde 2014. No entanto, a taxa de execuo ainda baixa. Nos primeiros cinco meses do ano, apenas R$ 507,19 milhes foram efetivamente pagos — o equivalente a 10,8% da verba prevista.
O Rio Grande do Sul foi o estado que ficou com a maior parte do dinheiro pago em 2024. Os R$ 410 milhes representam 80,7% do total. Destaque para as cidades de Porto Alegre, Eldorado do Sul, Canoas e Cachoeirinha. Juntos, os quatro municpios receberam R$ 36,7 milhes.
O programa Gesto de Riscos e Desastres da Defesa Civil apenas uma das aes desenvolvidas para mitigar os efeitos da crise no Rio Grande do Sul. Segundo o Poder Executivo, os recursos reservados para enfrentar a emergncia climtica no estado superam os R$ 60 milhes.
A medida provisria (MP) 1.218/2024 abre crdito extraordinrio de R$ 12,1 bilhes para o atendimento de municpios afetados pelas enchentes. A MP 1.223/2024 libera R$ 1,8 bilho para aes de apoio e de reconstruo. O governo federal reservou outros R$ 48 bilhes para medidas nas reas de crdito, segurana alimentar, sade, educao, segurana e reconstruo emergencial.
Alm disso, o Congresso Nacional aprovou a suspenso por trs anos do pagamento da dvida dos gachos com a Unio. Contados o principal e os juros da dvida, o benefcio pode gerar um alvio fiscal para o Rio Grande do Sul estimado em R$ 23 bilhes.
Sobre o
O “Recursos para gesto de riscos e desastres” tem como fonte a execução oramentria dos programas da Defesa Civil disponveis desde 2012 no Tesouro Gerencial. Os dados são nominais, sem correo por ndices inflacionrios. A ltima atualizao da plataforma ocorreu no dia 24 de maio.
O rene apenas informaes relacionadas ao programa de Gesto de Riscos e de Desastres. Obras como a construo de audes ou a transposio do Rio São Francisco, que poderiam mitigar a seca no semirido, por exemplo, no constam da plataforma. Isso porque essas despesas so tratadas em programas oramentrios especficos, não relacionados a desastres.
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