A retirada da aposentadoria especial para quem corre riscos no trabalho foi um dos principais pontos criticados pelos convidados ao debate sobre previdncia, ocorrido na manh desta tera-feira (20) na Comisso de Direitos Humanos (CDH). Eles debateram a Proposta de Emenda Constituio conhecida como reforma da Previdncia (PEC 6/2019), em anlise no Senado e j aprovada pela Cmara dos Deputados.
O artigo 201 da Constituio prev dois tipos de aposentadoria especial: aquela destinada a quem tem trabalho prejudicial sade — como as pessoas expostas a doenas em hospitais ou a elementos txicos como o benzeno — e a destinada aos que tm sua integridade fsica ameaada, como vigilantes e eletricitrios, porque correm riscos no exerccio dirio do ofcio.
Atualmente, a aposentadoria especial no tem idade mnima: exige-se apenas tempo de contribuio de 15, 20 ou 25 anos, dependendo da carreira. Com a reforma, a a existir idade mnima para aqueles cujo trabalho prejudicial sade (insalubridade) e acaba a aposentadoria especial dos que tm a integridade fsica ameaada.
A presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdencirio (IBDP), Adriane Bramante, explicou que o recebimento da aposentadoria especial por periculosidade (integridade fsica) j tem sido cada vez mais difcil e muitas vezes o cidado s consegue ter seu direito reconhecido se acionar a Justia.
Caso o Senado no mude o texto, essa modalidade de aposentadoria especial deixar de fato de existir.
— Eu quero ver o lixeiro aos 58 anos de idade correndo atrs do caminho de lixo, ou o eletricitrio subindo em poste aos 64 anos de idade — disse Adriane.
Ela tambm reclamou que o texto no est levando em conta aqueles que hoje j esto com direito adquirido, ou prestes a completar o tempo mnimo de contribuio.
— Se no vai ter mais aposentadoria por periculosidade, tudo bem. Mas podem apagar o texto constitucional sobre a integridade fsica daqui para trs? — questionou.
Duas carreiras da Justia sofrero impacto direto do fim da aposentadoria especial na reforma da Previdncia: oficiais de Justia e agentes de segurana dos tribunais e de juzes. O representante da Federao Nacional dos Trabalhadores do Judicirio Federal e MPU (Fenajufe), Fabiano dos Santos, comentou na audincia os riscos enfrentados por ambos e defendeu a manuteno da aposentadoria especial para eles.
Insalubridade
Em 1960 foi criada a aposentadoria especial para aqueles que tinham trabalho insalubre. O objetivo era tirar o trabalhador do ambiente nocivo antes que ele tivesse, efetivamente, um dano irreparvel a sua sade. A PEC 6/2019 mantm a aposentadoria para quem tem exposio a agentes nocivos qumicos, fsicos e biolgicos, mas a partir dessa reforma, o beneficirio precisa provar que efetivamente e pessoalmente teve contato frequente com esses elementos — ou seja, apenas ser enquadrado numa categoria funcional no o suficiente.
Um exemplo: voc no se aposenta por ser tcnico em radiologia. preciso provar que voc ava horas por dia fazendo exames numa mquina de ressonncia magntica.
Adriane Bramante destacou que a PEC traz pela primeira vez o quesito idade, somado ao tempo de contribuio, para a aposentadoria especial por insalubridade.
O escalonamento da idade mnima funcionar assim: no mnimo 55 anos de idade para quem tem aposentadoria especial, com tempo de contribuio de 15 anos (como os mineiros que trabalham no subsolo); 58 anos para quem precisa contribuir por 20 anos (como os mineiros que trabalham do lado de fora da mina); ou 60 anos para quem precisa contribuir por 25 anos, como alguns profissionais da rea de sade.
Embora a PEC 6/2019 diferencie a idade de aposentadoria para homens e mulheres ao longo de todo o texto, isso no acontece na aposentadoria especial por contato com agentes nocivos.
Quem representou os profissionais da sade na audincia foi o vice-presidente da Confederao Nacional dos Trabalhadores na Sade, Joo Rodrigues Filho. Ele demonstrou desnimo sobre o futuro dos trabalhadores da sade caso a reforma seja aprovada da forma como veio da Cmara.
— A maioria das pessoas que trabalha com raio X eventualmente desenvolve cncer e no chega a ser aposentado por muito tempo — comentou.
Em nome dos professores, que hoje recebem aposentadoria especial aps 25 anos de contribuio, a professora Selene Michielin tambm se queixou da reforma, por colocar idade mnima de 57 anos para mulheres e 62 anos para homens a partir de 2020.
Representante da Confederao Nacional dos Trabalhadores em Educao (CNTE), ela demonstrou preocupao com as regras que aproximam os professores da aposentadoria comum. De acordo com a professora, o aumento dos anos de trabalho somado aos baixos salrios e falta de incentivo para a carreira, podem aumentar o desinteresse pela carreira da educao.
— A profisso est em extino, os cursos de licenciatura esto vazios. Os professores ganham pouco, trabalham muito e no se aposentaro mais com tempo especial.
DRU
Quem dirigiu o debate na CDH foi a senadora Zenaide Maia (Pros-RN),que discorda com pontos fundamentais do texto elaborado pelo governo e aprovado pela Cmara.
— Minha digital no estar nesse texto — reforou.
Da carreira mdica, Zenaide lembrou que a Constituio de 1988 revolucionou a assistncia social ao criar o conceito de seguridade, cujos fundamentos so sade universal, previdncia e assistncia social. E ressaltou que esse trip , na verdade, superavitrio. De acordo com a senadora, o rombo na seguridade foi causado pela Desvinculao de Receitas da Unio (DRU), que chega a at 30% do Oramento.
— Do Oramento, o presidente pode usar 30% como quiser, com aprovao do Congresso. Sempre se tirou bilhes da seguridade para cobrir qualquer coisa. Eu j vi tirarem dinheiro para usar na comunicao e marketing da Presidncia — citou.
Zenaide disse que no ano ado a Previdncia deixou de arrecadar cerca de R$ 620 bilhes dos grandes devedores. De acordo com ela, a reforma da Previdncia no tira privilgio de ningum, s de quem j no tem privilgio, como os trabalhadores que ganham at dois salrios mnimos.
— Vo muito em cima dos trabalhadores do servio pblico, que desde 2013 j esto no Regime Geral e se quiserem se aposentar com integralidade, precisam pagar por fora. Nessa PEC, o tempo de pedgio para o servidor pblico est em 100%, mas para polticos, como deputados, senadores, prefeitos e governadores, o pedgio s de 30% — observou.
Direto da redao, Agncia Senado
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