Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justia (STJ), possvel reconhecer a responsabilidade civil de pessoa que transmite o vrus HIV no mbito de relao conjugal quando presentes os pressupostos da conduta - ao ou omisso - do agente: dolo ou culpa, dano e nexo de causalidade.
Baseado nesse entendimento, o colegiado, por unanimidade, confirmou acrdo do Tribunal de Justia de Minas que condenou um homem a pagar R$ 120 mil de indenizao por ter contaminado a ex-companheira com o vrus durante unio estvel.
As informaes foram divulgadas pelo STJ - o nmero deste processo no revelado por causa de segredo judicial.
A mulher ajuizou ao de indenizao contra o ex-companheiro - com quem manteve unio estvel durante 15 anos e teve trs filhos - por ter sido infectada pelo HIV nesse perodo. Ela pediu uma penso mensal de R$ 1.200 e danos morais no valor de R$ 250 mil.
Tanto a sentena quanto o acrdo de segunda instncia reconheceram a responsabilidade civil do ex-companheiro, seja por ter sido comprovado no processo que ele tinha cincia da sua condio, seja por ter assumido o risco com o seu comportamento.
A indenizao fixada em R$ 50 mil em primeiro grau foi aumentada para R$ 120 mil pelo Tribunal de Justia de Minas, mas o acrdo negou o pagamento da penso mensal.
Em recurso ao STJ, o ru alegou que o acrdo "foi omisso" e sustentou que "no foram preenchidos os elementos da responsabilidade civil".
A mulher, tambm em recurso ao STJ, pediu a reforma do acrdo para aumentar o valor da indenizao e fixar a penso mensal.
Sem precedentes
O relator, ministro Lus Felipe Salomo, salientou que no h precedente especfico no STJ para o caso em julgamento.
O ministro observou que a responsabilidade civil nas relaes de famlia vem sendo objeto de crescentes debates jurdicos, cabendo ao aplicador do direito a tarefa de reconhecer a ocorrncia de eventual ilcito e o correspondente dever de indenizar.
Segundo ele, no campo da responsabilizao civil por violao aos direitos da personalidade decorrente da Aids, as pretenses podem possuir as mais variadas causas, inclusive a transmisso do vrus no mbito da relao conjugal.
"Por bvio que o transmissor sabedor de sua condio anterior e que procede conduta de forma voluntria e dirigida ao resultado - contgio - responder civil e criminalmente pelo dolo direto de seu desgnio", ressaltou Salomo.
O ministro anotou que quando o portador no tem conscincia de sua condio, no apresenta sintomas da sndrome e no se exps, de alguma forma, ao risco de contaminao, muito dificilmente poder ser responsabilizado.
" o notrio caso do jogador de basquete conhecido como Magic Johnson, que, ao ser processado por uma de suas parceiras sexuais, baseou sua defesa justamente no fato de que, no momento da relao sexual supostamente causadora do contgio, no sabia que era portador do vrus HIV", destacou o ministro, lembrando que naquele caso o pedido de indenizao foi negado.
"Tambm penso que no h falar em responsabilizao ou dever ser ela mitigada quando a vtima houver concorrido de alguma forma para sua contaminao, seja assumindo o risco, seja no se precavendo adequadamente", observou.
Negligncia e imprudncia
O ministro ressaltou que quando o cnjuge, ciente de sua possvel contaminao, no faz o exame de HIV, no informa o parceiro sobre a probabilidade de estar infectado e no utiliza mtodos de preveno, "ficam evidentes a negligncia e a imprudncia".
"O parceiro que suspeita de sua condio soropositiva, por ter adotado comportamento sabidamente temerrio (vida promscua, utilizao de drogas injetveis, entre outras), deve assumir os riscos de sua conduta", disse Lus Felipe Salomo.
Para ele, no caso analisado, "ficou provado que o requerido foi o efetivo transmissor do vrus para a companheira, assumindo o risco com o seu comportamento".
"No presente caso, o requerido, ainda que no tivesse como desgnio a efetiva transmisso do vrus HIV, acabou assumindo o risco de faz-lo, seja porque j era sabedor de sua soropositividade no momento das relaes sexuais com a sua companheira, sem inform-la de sua condio e sem adotar as devidas precaues, seja porque adotava comportamento extraconjugal de risco (vida promscua), devendo ser responsabilizado por sua conduta", afirmou.
Ao confirmar a deciso do Tribunal de Justia de Minas, o ministro disse estar evidente a violao ao direito da personalidade da autora, "com leso de sua honra, intimidade e, sobretudo, de sua integridade moral e fsica, a ensejar reparao pelos danos morais sofridos".
Salomo afirmou que o tribunal de segunda instncia aplicou nesse caso, de forma correta, o mtodo bifsico para arbitramento da indenizao de danos morais.
Quanto pretenso da mulher de rever o entendimento da Corte de Minas sobre a penso, os ministros negaram provimento ao seu recurso especial porque "a anlise desse pedido exigiria o reexame de provas sobre a capacidade de trabalho da recorrente, o que no possvel por causa da Smula 7 do STJ".
Direto do Estado Contedo