Entidades mdicas apresentaram Agncia Nacional de Sade Suplementar (ANS) um parecer defendendo a mamografia de rastreio para todas as mulheres entre 40 e 74 anos. O documento tenta mudar o critrio a ser usado pela ANS para certificar planos de sade em seu novo programa de valorizao s boas prticas no tratamento do cncer.
Em dezembro do ano ado, a Agncia lanou uma consulta pblica para receber contribuies sobre o programa, e divulgou a cartilha preliminar com orientaes e critrios para os planos de sade que desejarem obter a certificao. Mas acabou sendo alvo de protestos.
Um dos principais critrios a realizao de rastreamento organizado, ou seja, a convocao das usurias para realizarem exames regularmente, mesmo sem sintomas. No caso do cncer de mama, a cartilha seguiu o protocolo do Ministrio da Sade e do Instituto Nacional do Cncer (Inca): mamografias a cada dois anos para as mulheres com idades entre 50 e 69 anos.
Mas para as entidades mdicas, essa faixa etria exclui uma parcela importante da populao. Aps os protestos, a ANS concedeu um prazo de um ms para que as organizaes apresentassem um parecer com evidncias cientficas, o que foi feito na semana ada.
Aumento de casos
Elaborado em conjunto pelo Colgio Brasileiro de Radiologia e Diagnstico por Imagem, Sociedade Brasileira de Mastologia e Federao Brasileira das Associaes de Ginecologia e Obstetrcia, o parecer argumenta que em 2024, 22% das mulheres que morreram por cncer de mama no Brasil tinham menos de 50 anos, e 34% tinham mais de 70.
Os estudos reunidos no documento tambm apontam que houve crescimento de casos de cncer em mulheres mais jovens, e que esses tumores geralmente so mais agressivos e tem mais risco de metstase.
Para as entidades mdicas, a mamografia deve incluir essas pessoas, porque o diagnstico de cncer em pessoas assintomticas, a partir de exames de imagem, demanda tratamentos que impactam menos a qualidade de vida da paciente, e tem menos risco de recidivas, metstases e mortalidade.
“No grupo do rastreamento, o tumor detectado no estgio inicial e apresenta caractersticas biolgicas menos agressivas, permitindo maior nmero de cirurgias conservadoras da mama. Essas pacientes tambm possuem menos indicao de quimioterapia, consequentemente com menores efeitos colaterais do tratamento” diz o parecer.
E as entidades complementam: “o diagnstico precoce tambm custo-efetivo e se associa a benefcios econmicos, porque reduz os custos do tratamento, ao evitar terapias caras para cnceres em estgios avanados”.
Efetividade
Mas de acordo com o diretor-geral do Inca, Roberto Gil, no h discusso sobre os benefcios do diagnstico precoce, mas sim sobre a efetividade de aumentar a idade dos exames de rastreamento, que devem ser feitos por todas as mulheres, quando no h sintomas ou suspeita.
"Nossa questo no est baseada na incidncia da doena abaixo dos 50 anos, mas nas fortes evidncias de que o rastreamento abaixo de 50 anos no tem sensibilidade, aumentando o risco de sobrediagnstico e de maior nmero de intervenes, sobrecarregando todo o sistema de Sade”, afirmou Gil na quinta-feira (27).
Em entrevista anterior Agncia Brasil, Gil enfatizou: "A informao cientfica que temos hoje no da opinio de um especialista, da literatura mdica, avaliada com o nvel de evidncia 1, meta-anlise e estudo randomizado, que o maior nvel de evidncia que se tem. Grande parte dos trabalhos no conseguiu mostrar nenhum aumento de sobrevida na faixa dos 40 aos 50 anos. S houve aumento de sobrevida na faixa de 50 a 69 anos.”
De acordo com ele, isso se explica pela maior densidade da mama de mulheres mais jovens, o que aumenta as chances de um resultado falso positivo, que precisar ser descartado por exames adicionais, ou at por cirurgias desnecessrias.
Cobertura
Mas tanto o Inca quanto as entidades mdicas defendem o rastreamento organizado, apontado como um dos principais responsveis pela queda nos casos de cncer em alguns pases desenvolvidos.
No Brasil, a cobertura da mamografia ainda um desafio. A ltima Pesquisa Nacional de Sade, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) em 2019, mostrou que menos de 60% das mulheres de 50 a 69 anos tinham feito mamografia h menos de dois anos da data da entrevista.
Para Roberto Gil, esse mais um argumento contra o aumento da faixa etria, porque a incluso de mais pacientes pode dificultar o o das mulheres que j esto cobertas pelo protocolo: "Se eu estivesse fazendo um salto em altura, eu botei o meu sarrafo em 2 metros e no estou conseguindo pular. A minha prxima medida vai ser tentar melhorar e treinar muito para pular os 2 metros, ou elevar o sarrafo para 2,50?"
Mas as sociedades mdicas temem que, se o protocolo do Inca for mantido como critrio pelo programa de acreditao da ANS, os planos de sade em a negar exames de rotina em pacientes fora da faixa etria, ainda que eles estejam cobertos pelo rol obrigatrio.
O parecer ressalta que o cenrio do rastreamento melhor na rede privada, onde "53% dos tumores so detectados pela mamografia, em pacientes assintomticas, e 40,6% so diagnosticados no estgio I (menos agressivo)", logo no h risco de prejuzo para as usurias que j tm indicao, caso mais mulheres sejam includas.
A ANS informou que recebeu o documento no dia 26 de fevereiro. "Neste momento, a proposta do Manual de Certificao de Boas Prticas em Ateno Oncolgica a pela anlise das mais de 60 mil contribuies recebidas durante a Consulta Pblica 144, sem previso de concluso", disse a ANS em nota.
A agncia complementou que as anlises vo embasar a proposta final de Certificao Oncolgica, que ser objeto de nova audincia pblica.
Agncia Brasil