Diariamente acidentes fatais ganham as manchetes do Leiagora. So jovens, idosos, crianas e s vezes famliasinteiras que se vo nas vias urbanas e nas rodovias que cortam Mato Grosso. As cenas, muitas registradas por cmeras de segurana, chocam e vo continuar chocando a sociedade, apesar da constncia com que as fatalidades se repetem.
E os nmeros no mentem. Alis, reforam a necessidade decampanhas de conscientizao para garantir um trnsito mais seguro, objetivo doDia Nacional do Trnsito, registrado em 25 de setembro.
S para se ter uma ideia, cerca de 3.134 acidentes de trnsito foram registrados em Cuiab e Vrzea Grande, entre janeiro e agosto de 2023. O levantamento da Secretaria de Estado de Segurana Pblica (Sesp).
Em comparao com o ano ado, a capital mato-grossense apresentou queda no nmero de acidentes, o que equivale a 43 casos a menos do que os relatados em 2022. J VG demonstrou aumento correspondente a 168 acidentes. Um absurdo, que, se s vezes no tem culpados, tem sempre responsveis.
Alm dos sinistros de trnsito registrados, operaes como a Lei Seca tambm chamaram ateno neste ano. Entre primeiro de janeiro e 15 de setembro, a Sesp contabilizou a priso de 1.007 motoristas por embriaguez ao volante. Nesse mesmo perodo, 13.142 condutores foram submetidos ao teste do bafmetro e 8.671 foram multados.
Quando felizmente no so fatais, os danos so sentidos no bolso dos envolvidos e no trnsito, que vira um verdadeiro caos.Diante deste cenrio, oLeiagoraentrevistou Christian Cabral, titular da Delegacia Especializada de Delitos de Trnsito (Deletran), para falar sobre cuidado, respeito e responsabilidade. E ele adianta: "Aregra muito simples, o trnsito no perdoa erros".
Confira a entrevista na ntegra:
Leiagora - Nos ltimos dias, relatamos muitos casos de acidentes de trnsito que resultaram em morte. A imprudncia contribui para essas tragdias e qual o papel da direo defensiva contra essa realidade?
Christian Cabral - A direo defensiva tem um papel muito importante na preveno de sinistros de trnsito, na medida em que permite a aquele condutor maior probabilidade de evitar o seu envolvimento nesses eventos. Por outro lado, o condutor que conduz seu veculo de forma imprudente, possui maior probabilidade de se envolver em sinistros de trnsito.
A regra muito simples, o trnsito no perdoa erros. Se a pessoa vai conduzir veculos trafegando em locais inapropriados, como na contra mo, sobre caladas e canteiros divisores de pista, ou usando aparelho celular, ou com os reflexos diminudos por cansao ou uso de substncias que interferem na capacidade de dirigir, e a eu no falo s da bebida alcolica e dos entorpecentes, mas tambm de muitos medicamentos comprados em farmcias, como analgsicos, antidepressivos, antialrgicos, relaxantes musculares, entre outros, questo de tempo para voc se tornar mais uma estatstica negativa no trnsito.
Leiagora - Na prtica, como a direo defensiva pode evitar acidentes?
Christian Cabral - Longe de ser uma atividade relativamente simples, o ato de dirigir uma tarefa complexa. O condutor recebe informaes continuamente, analisa-as, identifica situaes de risco e toma decises. O condutor que pratica a direo defensiva possui condies de identificar as situaes de risco com maior antecedncia e assim tomar as decises necessrias para evitar a ocorrncia de um sinistro de trnsito.
O tempo tem revelado que a via da educao no tem conseguido produzir os resultados desejados. Nesse cenrio, no resta outra opo que no o emprego da punio. O problema que entre o que est escrito na lei e o que acontece na prtica, existe um grande abismo
Leiagora - Na sua avaliao, o que ainda falta para aumentar a efetividade das campanhas de conscientizao sobre educao no trnsito? Afinal, quase diariamente so vrios os condutores autuados e at presos nas blitzes, por dirigir sob efeito de lcool.
Christian Cabral - Como acontece em outros aspectos da vida humana, a regra que comportamentos sejam moldados atravs da educao, quando essa via falha, recorre-se a punio. No trnsito, no diferente.
No Brasil, ns temos uma experincia de sucesso envolvendo a mudana de comportamento atravs da educao, que da necessidade do uso do cinto de segurana. Todavia, em relao a outros temas como excesso de velocidade e uso de lcool, o tempo tem revelado que a via da educao no tem conseguido produzir os resultados desejados. Nesse cenrio, no resta outra opo que no o emprego da punio.
Infelizmente, apesar do grande nmero de aes de fiscalizaes executadas para reprimir a conduta de dirigir sob efeito de lcool, o nmero de condutores efetivamente punidos nas esferas istrativas e criminais por essa prtica muito baixo e isso, acredito, seja a explicao para ainda registrarmos to alto os nmeros de condutores conduzindo seus veculos sob efeito de lcool no pas.
Leiagora - Ento a impunidade ou as punies mais brandas contribuem para essa cultura de um trnsito violento?
Christian Cabral - Sim, o que acredito.
Leiagora - Um exemplo de penas leves para a fuga do local e omisso de socorro, que preveem penas de apenas seis meses a um ano de deteno e multas. O quanto isso influencia?
Christian Cabral - Quando uma pessoa se envolve em um sinistro de trnsito, a depender dos fatos, ela corre o risco de ser responsabilizada criminal, cvel e istrativamente, sendo que no crime, pode, inclusive, ser presa em flagrante delito. Nesse cenrio, o condutor faz uma rpida anlise: se eu ficar aqui, corro o risco de ser preso e de receber um punio, e se eu fugir, no serei preso, posso no ser identificado e ficar livre das demais responsabilidades e, na hiptese de ser identificado, ficar sujeito ao incremento de uma penalidade irrisria, pela prtica dos crimes de fuga e omisso de socorro.
Leiagora - Geralmente muito complicado comprovar o dolo eventual nesses casos de acidente, mesmo com a embriaguez ou o excesso de velocidade. Isto no frustrante principalmente para as vtimas ou para os parentes daqueles que no sobrevivem?
Christian Cabral - O dolo eventual uma construo jurdica que diz que se o agente no quis o resultado, mas assumiu o risco de caus-lo, responde como se tivesse desejado diretamente o resultado. Ou seja, tudo gira em torno de elementos subjetivos de difcil constatao e comprovao. Ora, eu posso avanar um sinal vermelho com o meu carro, estando ciente do risco de um acidente e assumindo o risco de caus-lo, como tambm posso faz-lo por imprudncia, negligncia ou impercia, que so elementos caracterizadores da culpa.
Acredito que a melhor soluo para contornar essa problemtica foi a adotada pelo Cdigo de Trnsito com a estipulao de penas diferenciadas e mais duras para aquele condutor que desse causa a sinistros de trnsito com vtimas fatais ou gravemente lesionadas, estando conduzindo veculo sob influncia de lcool.
Leiagora - Existe, atualmente, algum debate sobre a mudana nas penas do Cdigo de Trnsito Brasileiro?
Christian Cabral - No existe, mas deveria existir. Grande parte dos crimes de trnsito hoje so punidos com penas de deteno, no permitem prises cautelares, item a suspenso condicional do processo ou a realizao de acordo de no persecuo penal que impedem a condenao do agente e, nos raros casos em que o processo chega a fase da condenao, a pena imposta de restrio de direitos.
Nesse cenrio, seria mais efetivo para a sociedade, para a justia pblica e para as vtimas e seus familiares que esses ilcitos deixassem de figurar como ilcitos criminais e se tornassem apenas ilcitos civis.
Leiagora - Certo Dr., mas pra gente entender isso na prtica, qual a diferena entre os ilcitos criminais e os ilcitos cveis, e como eles ariam a funcionar com essa mudana?
Christian Cabral -Hoje, esses crimes a, nenhum deles termina com ningum preso efetivamente. As penas so muito baixas e antes dessas penas baixas tem a transao penal, tem um acordo de no persecuo penal e, se nada disso acontecer, l na frente a condenao vai se resumir a uma pena restritiva de direito, a pessoa no fica presa, vai prestar servio comunidade, vai pagar a cesta bsica, alguma coisa. Como a pena muito baixa, s vezes a pessoa utiliza isso em benefcio prprio e acaba no fazendo uma coisa e nem outra porque o crime prescreve e ela sai impune. Por outro lado, as vtimas esto l angustiadas querendo receber algo em troca pela leso que sofreram na sua integridade, no seu patrimnio.
Se voc transforma isso em ilcito cvel, a j no se tem prescrio porque as aes cveis tm prescrio apenas para ajuizamento, uma vez ajuizado uma ao cvel, ela no prescreve mais, ao contrrio da criminal, que ela fica sujeita a prescrio at o trnsito em julgado. O ilcito cvel vai impor uma responsabilidade pecuniria para o causador do acidente, que o que vai fazer realmente ele mudar o comportamento n, porque tudo t se resumindo em dinheiro hoje na questo do trnsito, a transao penal, o acordo de no persecuo penal, tudo isso envolve, e a pena restritiva de direito tambm envolve um dispndio de quantia financeira.
E a, voc pode tambm com isso atender a vtima, uma parte desse valor da condenao cvel pode ser revertida em favor da vtima para minorar as consequncias dela. Tem alguns pases que trabalham assim, voc diminui e deixa como crime apenas aqueles casos que so extremamente graves e merecem uma ao de represso do estado e que culminam em penas restritivas de liberdade. Para os casos de restrio de direitos, voc j substitui por um ilcito cvel e condena a pessoa ao pagamento de uma quantia financeira, produz mais resultado, um processo mais rpido porque no fica sujeito a essa srie de garantismo que tem na legislao processual penal.
Leiagora - Qual a sua opinio sobre as penas e punies em casos de acidentes com morte no trnsito?
Christian Cabral - As penas so extremamente baixas e incapazes de gerar as mudanas de comportamento esperadas pelo temor que elas deveriam impor.
Leiagora - sempre vlido reforar as penalidades previstas na lei para quem dirige sob efeito de lcool. Voc poderia falar sobre isso?
Christian Cabral - Na teoria, as penas para quem dirige com a capacidade psicomotora alterada por influncia de lcool so bastante duras. istrativamente, o condutor recebe 7 pontos em seu pronturio e fica sujeito pena de suspenso do direito de dirigir por 12 meses, enquanto o veculo recebe uma multa de R$2.934,70.
Criminalmente, o condutor fica sujeito a ser preso em flagrante delito, caso em que, para ser solto ter que pagar uma fiana que pode variar entre 1 a 100 salrios mnimos e, em caso de condenao, fica sujeito a uma pena de deteno de seis meses a trs anos. O problema que entre o que est escrito na lei e o que acontece na prtica, existe um grande abismo.
Leiagora - comum ns ouvirmos, principalmente de quem vem de fora, que as pessoas daqui so "ruins de volante", no do seta, ultraam no lugar errado, etc. Como possvel mudar esse comportamento do motorista local?
Christian Cabral - Esse um problema afeto s aes de educao e fiscalizao que so realizadas. Um detalhe que chama ateno e que pode ajudar a entender o problema, que muitos dos condutores que aqui realizam grandes barbries na direo de seus veculos, quando viajam para pases da Amrica do Norte e da Europa, conduzem os veculos que utilizam com extrema prudncia e cuidado, o que faz com que desconfiemos que a sensao de impunidade aqui presente possa ser o fiel da balana.
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