“Em tempos de fake news fundamental que saibamos diferenciar o que fato e o que boato”. O alerta da escritora e pesquisadora Januria Cristina Alves, autora do Abecedrio de personagens do folclore brasileiro (FTD Educao e Edies Sesc).
A autora explica que alguns seres e entidades mitolgicas ajudam a explicar fenmenos da natureza, como o fogo-ftuo; ou se vinculam a crendices populares ligadas sade ou alimentao, como o Papa-Figo (corruptela de Papa-Fgado). Por outro lado, lendas como Chupa-Cabra e Mapinguari no tm nenhuma comprovao cientfica ou prova material da sua existncia.
“Nesse sentido, o folclore nos d uma lio importante: os fatos possuem uma comprovao cientfica, fundamentada em evidncias que sustentam a existncia ou no daquele personagem ou situao. Os boatos, ao contrrio, se alimentam do medo e da ignorncia.”
Conhea cinco mitos folclricos que desafiam a cincia, selecionados por Januria Cristina Alves e representados pelas ilustraes do designer e ilustrador Berje no livro Abecedrio de personagens do folclore brasileiro.
Chupa-Cabra
Tudo comeou em Porto Rico, em maro de 1995, quando apareceram em uma fazenda oito cabras mortas com diversas perfuraes no trax e esvadas em sangue. Depois delas, o fenmeno se repetiu na Flrida (Estados Unidos), na Nicargua, no Chile, no Mxico e aqui no Brasil, envolvendo tambm a morte de bois e de vacas. Em comum, todos os bichos tinham vrias marcas no pescoo e seu sangue era inteiramente drenado (chupado). No demorou muito e apareceram vrias “testemunhas” que juravam ter visto o responsvel pelas mortes, o tal Chupa-Cabra. Para os mais cticos, a cincia tem uma explicao bem mais prosaica dos fenmenos que teriam matado os animais daquelas regies: podem ter sido ataques de animais selvagens, como a ona-pintada e o puma, ou ainda ces ferozes. O aumento da temperatura e o prolongamento das secas sazonais tambm poderiam ter causado a migrao desses bichos, que, em busca de mantimentos, atacavam os animais de curral, como cabras e bois.
Fogo-Ftuo
O Fogo-Ftuo um personagem famoso no Brasil inteiro, e no mundo tambm. Difcil encontrar algum que nunca tenha ouvido falar do “fogo que se move”, corre daqui, corre de l, voando como relmpago, flutuando no cu de noite, parecendo morcego em forma de labaredas. O Fogo-Ftuo s aparece noite e seu local preferido so os cemitrios ou pntanos desertos e escuros. Dizem que v-lo d azar. E que ele tambm no gosta que as pessoas invadam seus territrios, por isso assustam os pescadores noturnos. Algumas pessoas preferem acreditar que essa lenda possui um fundamento cientfico: trata-se de um fenmeno causado pela combusto espontnea do gs metano e da fosfina, presentes na decomposio de seres vivos (plantas e bichos) nos locais pantanosos.
Isquel
aquela assombrao que todo mundo viu ou, pelo menos, acha que viu uma vez na vida: um monstro com forma humana que s osso! L em Minas Gerais, na regio do rio So Francisco, o povo o chama de Isquel provavelmente para abreviar o seu nome verdadeiro: “esqueleto”. Os habitantes dessa regio dizem que ele s aparece mesmo, de verdade, nas encruzilhadas ou nos chamados “pontos de fora”, onde h muita energia concentrada. Outros ainda dizem que j viram o Isquel com uma tocha acesa na cabea de osso — at ouvem o rudo de seus ossos balanando e do fogo aumentando. Atribui-se ao suposto fenmeno a mesma explicao cientfica que se d para o Fogo-Ftuo.
Mapinguari
Os seringueiros da Amaznia ajudaram a popularizar a lenda desse bicho imenso, parecido com o homem, coberto de pelos grossos (o que o torna imune a qualquer bala) e que tem uma armadura feita do casco da tartaruga. H quem diga que sua pele semelhante ao couro do jacar. A lenda do Mapinguari impressionou tanta gente que os cientistas tentaram descobrir se ele realmente existia. O paleontlogo argentino Florentino Ameghino (1854-1911) no final do sculo XIX levantou uma hiptese a respeito: os Mapinguaris seriam algumas preguias gigantes que teriam sobrevivido no interior da floresta amaznica. J o ornitlogo estadunidense David Conway Oren, ex-coordenador de pesquisa no Museu Paraense Emlio Goeldi, em Belm, faz expedies em busca de provas da existncia do Mapinguari, por mais de vinte anos, mas no conseguiu nenhum resultado conclusivo.
Papa-Figo
Terror das crianas pernambucanas, o Papa-Figo (de Papa-Fgado) o equivalente ao Homem do Saco e, tambm, em alguns casos, ao Lobisomem, pois aquele homem velho que mata criancinhas para comer-lhes o fgado. um velho, muito velho, que cheira a carne podre (pois dizem que ele tem lepra e que suas chagam fedem) e anda com um saco nas costas em busca de crianas malcriadas para raptar. Dizem que gosta de agir no final da tarde, horrio em que a crianada sai da escola, atraindo-as com brinquedos ou promessas de lev-las a um lugar bonito. A histria to famosa em Pernambuco que mereceu at um registro do grande escritor pernambucano, Gilberto Freyre, em sua consagrada obra Casa-grande & senzala (1933): “E havia ainda o papa-figo — homem que comia fgado de menino”. H registros que, na poca, acreditava-se que comer fgado de gente curava lepra, uma doena de pele considerada grave. Havia ainda quem garantisse que comer o fgado de algum “limpava o sangue”, o que seria bom para a sade.
Servio
Abecedrio de personagens do folclore brasileiro
Editora:FTD Educao e Edies Sesc So Paulo
Autora:Januria Cristina Alves
Ilustraes:Berje
Nmero de pginas:416 pginas
Formato:16 cm x 23 cm
www.lumisfera.com.br
Da assessoria